Fato incontroverso é que todo casamento e toda união estável tem que ter necessariamente um regime de bens, seja por escolha do próprio casal ou por determinação legal (comunhão universal ou separação obrigatória).
O regime de bens é que vai orientar a parte financeira do casal, quais bens pertence a quem, como é a divisão, dentre outros aspectos.
A legislação brasileira prevê quatro regimes: comunhão universal, comunhão parcial, separação total (obrigatória ou consensual) e participação final nos aquestos. Além dessas específicas, é possível criar uma mista e individualizada, através da confecção de pacto antenupcial.
Sendo assim, o regime de bens começa a vigorar a partir da celebração do casamento e com o passar dos anos é possível que o regime de bens escolhido pelo casal não mais se encaixe à realidade dos cônjuges. Nessa situação é possível fazer a alteração do regime de bens!
Para tanto, via de regra, a alteração do regime de bens, o casal deverá seguir os requisitos previstos no §2º do art. 1.639 do Código Civil, devendo o pedido ser processado no Poder Judiciário, a saber:
– Pedido motivado por ambos os cônjuges: na petição inicial deverá constar o desejo e assinatura de ambos os cônjuges, caso contrário, não haverá possibilidade de deferimento do pedido, assim, permanecendo o regime escolhido antes do casamento.
– Autorização judicial: é necessário que o pedido de alteração de regime seja feito por via judicial, não sendo possível apenas o ato volitivo das partes.
– Pedido motivado: o pedido deverá ser justificado, de forma que as partes possam se valer de suas vontades sem que haja influência uma das outras.
O Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento que não é necessário se alongar nessa justificativa ou apresentar provas exageradas, mas sim, apresentar de forma objetiva o que se pretende.
Sobre este ponto, um caso de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, que tratava sobre a possibilidade de modificação do regime de bens escolhido pelo casal, já autorizada pelo artigo 1.639, § 2º, do Código Civil de 2002, constou que o pedido pode ser atendido ainda que o casamento tenha sido celebrado na vigência do Código Civil anterior.
Destacou o acórdão: “Na sociedade conjugal contemporânea, estruturada de acordo com os ditames assentados na Constituição de 1988, devem ser observados – seja por particulares, seja pela coletividade, seja pelo Estado – os limites impostos para garantia da dignidade da pessoa humana, dos quais decorrem a proteção da vida privada e da intimidade”.
A preocupação do colegiado consistiu em não impedir a liberdade dos cônjuges na escolha da melhor forma de condução da vida em comum. Em seu voto, Andrighi também considerou a presunção de boa-fé e a proteção dos direitos de terceiros conferida pelo dispositivo legal em questão.
– Ressalvados os direitos de terceiros: a alteração do regime de bens não poderá ocasionar lesão a direitos de terceiros.
Nesse sentido, é importante destacar o entendimento da doutrina brasileira em jornada de Direito Civil, segundo o Enunciado nº 113 do CEJ da CJF ao dizer que: “É admissível a alteração do regime de bens entre os cônjuges, quando então o pedido, devidamente motivado e assinado por ambos os cônjuges, será objeto de autorização judicial, com ressalva dos direitos de terceiros, inclusive dos entes públicos, após perquirição de inexistência de dívida de qualquer natureza, exigida ampla publicidade”.
De modo, geral é preciso é demonstrar que o casal não está tentando prejudicar terceiros, e a forma de fazer isso é apresentando certidões negativas de tributos, de processos, de protesto, etc.
No mais, a competência para julgar ação de alteração consensual de regime de bens no casamento é da Vara de Família. E conforme aduz o art. 734 do Código de Processo Civil, há ainda obrigatoriedade da intimação do Ministério Público para se manifestar nos autos, assim como haverá a necessidade de publicação de edital informando o desejo de alteração do regime.
Por fim, entende-se que, caso seja do interesse de ambos os cônjuges em escolher outro regime de bens, haverá a possibilidade de fazer tal alteração. E sendo autorizada a alteração do regime de bens pelo Juiz, deverão ser expedidos mandados de averbação aos Cartórios de Registro Civil e de Imóveis (para a alteração, por exemplo, da certidão de casamento e nas matrículas dos imóveis do casal) e, caso um dos cônjuges seja empresário, ao Registro Público de Empresas Mercantis.
Assim, é fundamental que o casal esteja assistido e busque orientação de advogado, antes da celebração do matrimônio para a escolha do regime de bens que melhor encaixe à realidade dos cônjuges, bem como na constância o casamento, eis que na prática a vida conjugal e a realidade financeira do casal tende a mudar com o passar dos anos.
Cecile Rocha de Oliveira é Bacharel em Direito pelas Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU e Pós-graduada em Direito Processual Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Atualmente é membro da Comissão de Direito Civil e Comissão de Direito de Família e Sucessão da OAB Butantã. Possui experiência em contencioso cível em geral, atuando nas áreas de Direito Civil, Consumidor, Saúde, Imobiliário, Família e Sucessões.